50 anos após 64: A hora de derrotar a herança da ditadura militar!

Faço votos que no dia 30 de março 2064, além de lamentar os 20 anos de rompimento da democracia, tenhamos motivos para celebrar a democracia plena e os objetos em questão já estejam superados

Por Tiago Soares
Terça-feira, 1 de abril de 2014


Passados 50 anos do golpe militar, os abusos ainda continuam a ser praticados por forças de repressão do Estado brasileiro. O dilema de enfrentar dados dolorosos de jovens negros e periféricos que são assassinados todos os dias e, na maioria das vezes, pelas mãos de agentes de segurança pública comprovam que o período sombrio de nossa história deixou uma herança maldita: a desnecessária militarização das corporações que ainda se organizam com a mesma orientação ideológica daquele período.

Herança essa que o partido dos trabalhadores – desde a sua fundação na defesa da democracia pelas diretas, com a participação de militantes do movimento negro – já denunciava como uma questão fundamental a ser enfrentada, seja no parlamento, nos governos democráticos e populares ou pelos movimentos sociais. Na gestão da Prefeita Luiza Erundina foi constituído o Movimento Ousado de Alfabetização (MOVA), que resultou em torno de 20 mil jovens e adultos alfabetizados. Além disso, houve instalação de mil núcleos em comunidades ainda com uma visão universalista de execução das políticas públicas – ali já expressava um sentimento em promover mais direitos àqueles que nunca tiveram.

Importante lembrar que até 1988 a educação não era direito de todos (as) no Brasil e a população negra era a que mais sofria, pois a única política pública até então era a FEBEM (Fundação Estadual do Bem Estar do Menor). Criada durante a ditadura militar, a instituição era marcada pela política truculenta e violenta de encarceramento em grandes complexos e serviu para coibir os jovens da classe trabalhadora a levantarem-se contra o regime ditatorial. Quem nunca ouviu dos mais velhos: “depois das dez não podia ficar na rua, pois o juizado de menores levava, batia e rapava a cabeça (um método de tortura física e psicológica)”.

No Brasil, o processo de afirmação dos direitos de cidadania (ainda inconcluso) irá conferir um grau maior de ambigüidade nas medidas de proclamação e de implantação do direito à educação, uma vez que apenas a partir de 1988 uma concepção universalista dos direitos sociais foi incorporada ao sistema normativo brasileiro e que o processo de afirmação dos direitos no país foi assinalado pela defasagem entre os princípios igualitários proclamados na lei e a realidade de desigualdade e de exclusão (TELLES, 1999).

A última década, com os governos do PT (Lula e Dilma) e as diversas políticas públicas de distribuição de renda e inclusão, permitiu ascensão econômica e social para parte da classe trabalhadora. Entretanto, estatísticas apontam que, mesmo com as medidas do governo federal, o Brasil ainda não conseguiu superar o aparato de repressão estatal, constituído nas corporações das polícias militares e seus similares – que matam e torturam jovens negros e pobres das periferias todos os dias. Para que possamos superar e conquistar o exercício pleno da democracia no próximo período, o partido e os governos por onde administra têm que estimular a sociedade a refletir e debater a atual “militarização” dos agentes de segurança pública, a implementação da política de redução de danos, a unificação das corporações militares, aprovação do PL 4471/2012 (que trata do Auto de Resistência), constituir políticas públicas que consigam envolver os três entes da federação para o enfrentamento ao extermínio da juventude negra.

O Programa Juventude Viva pode ser a porta de entrada desse processo, desde que se constitua em um marco legal e seja transformado em política de estado, para tornar um instrumento institucional de pressão por parte da sociedade civil aos diversos governos. Para que isso ocorra é necessário constante pressão e organização do partido e dos movimentos que já estão nessa luta aos governos municipais, estaduais e federal.

Faço votos que no dia 30 de março 2064, além de lamentar os 20 anos de rompimento da democracia, tenhamos motivos para celebrar a democracia plena e os objetos em questão já estejam superados.

*Tiago Soares é historiador e secretário do Setorial de Direitos Humanos do PT-SP

Referência

TELLES, Vera da Silva. Direitos Sociais: afinal do que se trata? Belo Horizonte: UFMG, 1999




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