Após eleição, partido de esquerda aposta em estratégia de “reconciliação nacional” em El Salvador

Para analistas, cenário futuro é difícil para partido de esquerda, mas afastaram previsões de catástrofe e ingovernabilidade

Por Opera Mundi
Quarta-feira, 19 de março de 2014


Depois de um longo processo eleitoral, concluído nesta quinta-feira (13/03) com a proclamação de Salvador Sánchez Cerén, do partido de esquerda FMLN (Frente Farabundo Martí para a Libertação Nacional), como presidente eleito de El Salvador, analistas consultados por Opera Mundi preferem não se somar à tese de que, devido a pouca diferença de votos, há um cenário turbulento à frente. Pouco mais de seis mil votos separaram Sánchez Cerén de Norman Quijano, do partido de direita Arena.

Para os especialistas, os próximos anos deverão ser marcados pela divisão, com o governo tendo dificuldades para desenvolver seu programa, mas afastam previsões de catástrofe. “É preciso começar a desmistificá-las e analisar com seriedade o que aconteceu durante o processo eleitoral”, disse o economista César Villalona. Para ele, o que aconteceu no domingo (09/03) não se tratou somente de uma vitória da FMLN sobre o Arena e seu aparato propagandístico, mas uma conquista com um “candidato próprio, que vem das mesmas entranhas da guerrilha e do partido”.

De acordo com o analista dominicano, radicado em El Salvador, o fato demonstra que o voto da FMLN é “mais comprometido, de desafio à direita e massivo”. Conforme os resultados publicados pelo TSE (Tribunal Supremo Eleitoral), Sánchez Cerén obteve quase 1,5 milhões de votos – a soma mais alta de toda a história de El Salvador. Além disso, ressalta, se trata de um voto que supera o do Arena até na qualidade, que conseguiu desfazer uma desvantagem de 10% somando quase 450 mil votos, porém, “uma parte significativa vinda da campanha de medo, da compra e coação de votos, de pessoas que não necessariamente são de direita”, explicou.

Campanha

Carlos Molina Velásquez, filósofo professor da UCA (Universidade Centro-americana), afirmou que “depois da derrota de 2 de fevereiro, Quijano direcionou uma campanha suja com o tema da Venezuela e isso teve impacto em vários setores da sociedade salvadorenha, ainda vulneráveis a mentiras”. Ainda segundo ele, “mexeram com o mais primário e visceral das pessoas e funcionou. É um alerta para o futuro governo”.

Nesse contexto de manipulação midiática e uso de rumores, a vitória da FMLN teve ainda mais valores, disseram os analistas. “A cotação aumentou em todo o país e a FMLN, não só conseguiu se defender dessa campanha, mas ganhou com plena legitimidade e com um caudal de votos nunca antes visto”, ressaltou Molina.

De acordo com ele, esses elementos são suficientes para contra-atacar a estratégia atual do Arena, que pretende apresentar ao mundo a imagem de um país partido em dois, onde a metade da população não reconhece a legitimidade de Sánchez Cerén, nem de seu futuro governo. “Usam a palavra ‘dividido’ como sinônimo de ‘ingovernável’ e de difundir a ideia de que a FMLN partiu o país e não é assim. O que contou de verdade foi a fortaleza institucional [do país], e essas eleições demonstraram que El Salvador tem instituições fortes”, continuou Molina.

Já para Villalona, em El Salvador está acontecendo uma “ruptura histórica”, quando “por um lado a maioria votou pelo projeto da esquerda e, por outro, a direita tem menos respaldo do que aparenta no voto”. Segundo ele, nessas eleições há um “avanço de pensamento de esquerda e progressista”, ao mesmo tempo em que a ultradireita retrocede. “Podia ser o início de uma mudança que é necessária e urgente”, acrescentou.

Governo de todos

Salvador Sánchez e seu vice, Oscar Ortiz, não pouparam oportunidades para enviar mensagens de diálogo com os setores opositores possíveis para a construção de uma agenda comum. Além disso, procuraram sedimentar, no imaginário coletivo, a ideia de que o governo será de unidade, com um modelo próprio de país e que governarão para todos, independente da ideologia partidária ou por quem votaram nas eleições passadas.

“Não será fácil, porque o Arena fará de tudo para desgastar o governo de Sánchez Cerén, prevendo as eleições legislativas e municipais do próximo ano. No entanto, a FMLN é muito hábil e continuará enviando sinais aos setores produtivos, à direita menos teimosa e à população em geral, para gerar confiança e impulsionar um projeto de país inclusivo e unidade”, disse Molina.

Depois do segundo turno, o Arena promove uma campanha de desprestígio das autoridades eleitorais, as acusando de serem parciais a favor da FMLN e até de terem cometido fraude. A estratégia, aliada à campanha midiática, criaram um clima de angústia, atrasando o processo de escrutínio definitivo. “Eles sabem que perderam e o objetivo real é que, o governo que surja, seja o mais ilegítimo possível ante a população. Uma grande aliança contribuirá para a governabilidade e aprofundará as mudanças iniciadas no atual governo”, concluiu Villalona.




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