Duas ações policiais e a banalização da vida do pobre

A Polícia Civil invadiu a comunidade atirando e a PM avançou contra os moradores após protestos

Por Spresso SP
Quarta-feira, 26 de fevereiro de 2014


Na última terça-feira (25), pouco tempo após as 16h, três policiais do Departamento Estadual de Prevenção e Repressão ao Narcotráfico (Denarc), em um carro preto, teriam invadido a favela do Moinho disparando tiros para o alto, segundo os moradores, que reagiram e apedrejaram o carro. Os agentes, então, foram obrigados a sair.

Pouco tempo depois, os mesmos policiais retornam ao local com reforço e novamente invadiram a comunidade. Dessa vez, um homem – ainda não identificado – foi preso. As moradias da comunidade foram revistadas e, segundo os moradores, “muitas pessoas foram esculachadas”. Na saída, mais tiros.

“Eles atiraram contra a gente, é um milagre ninguém ter morrido aqui. Fui chamada de vagabunda”, afirma Alessandra Moga, líder comunitária. Na entrada da favela, era possível ver inúmeras cápsulas de balas de pistola .40.

O especialista em segurança pública Guaracy Mingardi afirma que a operação foi “equivocada”. “Mesmo que os policiais não tenham entrado atirando, o simples fato de uma operação provocar toda essa reação mostra uma inépcia do comando. A operação tem que ser discreta. Se tem mandado de prisão, vai com efetivo policial, entra todo mundo, rapidamente, sem violência e prende o suspeito.”

Caio Castor, um dos líderes da comunidade, concorda com Mingardi. “Se eles tivessem chegado, se identificado, e nos informassem o que está acontecendo, não teria tido as consequências que tiveram. Eles perderam o controle.”

Para o especialista, a operação só aconteceu dessa forma porque era uma favela. “Se fosse em outro local, a ação seria discreta, o que é um absurdo. A polícia deveria agir da mesma forma em qualquer lugar. A atual direção do Denarc não é das mais habilidosas.”

“Arrego”

Moradores ouvidos pela reportagem do SPressoSP afirmam que os três policiais que chegaram primeiro ao local queriam pegar o “arrego” – propina recebida de traficantes.

“Eles estavam atrás do “arrego” e não conseguiram, mas já tinham feito muito barulho. Foi aí que tiveram que sair e buscar apoio, para justificar a merda”, afirma Castor.

No dia 24 de janeiro deste ano, a “Folha de S. Paulo” revelou que dois policiais da Polícia Civil, sendo um do Denarc, estão sendo investigados pela Corregedoria sob suspeita de comandar o tráfico na região conhecida como Cracolândia. A revelação veio após outra controversa operação da PC no local, que quase prejudicou o andamento do programa “De Braços Abertos”, da Prefeitura paulistana.

A Secretaria de Segurança Pública (SSP) afirmou que os agentes foram recebidos com tiros e que não houve “truculência por parte dos policiais”. A reação dos moradores, segundo a SSP, teria sido em função de uma prisão efetuada no local e não de tiros disparados pelos agentes.

O homem preso seria “segurança dos traficantes”, segundo a SSP, e a operação no local resultou na apreensão de 259 porções de cocaínas e 150 pedras de crack.

Protestos e repressão policial

Revoltados com a operação da Polícia Civil, moradores do Moinho carregaram sofás, sacos de lixo, colchões e madeiras para a avenida Rio Branco – que fica ao lado da comunidade – e fecharam os dois sentidos da via, após atearem fogo nos objetos.

Aproximadamente 30 minutos depois, a Polícia Militar chegou ao local para dispersar cerca de 100 moradores que protestavam. Sem qualquer negociação com as lideranças, os agentes começaram a atirar bombas de gás lacrimogêneo e disparar balas de borracha contra os manifestantes.

Uma mulher, atingida por uma das bombas, teria sofrido convulsão no local. “Ainda não sabemos a identidade dela, mas ela foi levada pelo carro de reportagem da CBN para o hospital”, afirma Castor (até o fechamento desta matéria não foi possível apurar quem seria a vítima e para onde foi levada).

Após 20 minutos de correria, o protesto acabou, os bombeiros chegaram para apagar o fogo e a avenida foi liberada. Moradores reclamaram da falta de negociação e da truculência policial.




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