Emílio Lopez: O comício do PT pelas Diretas e a conquista da democracia

O histórico comício de 25 de janeiro de 1984, aniversário da cidade de São Paulo,na Praça da Sé

Por Emílio Carlos Rodriguez Lopez, especial para o Viomundo
Quarta-feira, 27 de novembro de 2013



Eu tive a sorte de estar presente nestes dois momentos históricos na Praça Charles Muller, em frente ao estádio municipal do Pacaembu. Em 1982, quando houve o grande comício de encerramento da campanha do Lula a governador do Estado de São Paulo. Em 27 de novembro de 1983, quando o PT fez o seu primeiro comício pela Campanha das Diretas.

Era o velho PT, com suas barraquinhas. Os comícios lembravam quermesses. Eram fundamentalmente momentos de convivência e de muito debate e educação política. Era tudo muito prazeroso: rever os amigos, conversar muito… E assim foi sendo formada uma geração de militantes.

Ali, naquele ato de 1983, foram gritados pela primeira vez os slogans que, meses depois, seriam os de milhões de brasileiros: “Um, dois, três, quatro, cinco mil, queremos eleger o presidente do Brasil”; “presidente quem escolhe é a gente”.

Pode-se discutir se aquele ato de 1983 foi pequeno, por que não conseguiu atrair todos os partidos políticos de oposição à época… Mas nada se pode dizer contra a importância do PT ter sentido que o momento em que se poderia alcançar a democracia e a liberdade era aquele.

Esse esforço mostrou que era possível organizar a sociedade. E, assim, em 25 de janeiro de 1984, aniversário da cidade de São Paulo, foi chamado o grande ato na Praça da Sé, ao qual compareceram mais de 300 mil pessoas.

Ali, ficou clara a posição da Globo, que não cobriu o ato. Muitos jornais também o ignoraram. Mas a campanha foi crescendo e realizou os maiores comícios no período republicano. A experiência mostrou que a mídia era seletiva e comandada pela ditadura . Nascia aí um grito de guerra: “Fora Rede Globo, o povo não é bobo”, ouvido nas manifestações deste ano.

A Campanha das Diretas ocorreu em meio à forte recessão. Um texto brilhante de Dalmo Dallari, publicado em jornais da época, mostrou que recuperar o direito ao voto era a possibilidade de o povo influir nos rumos da política econômica e conseguir o direito ao pão. Às vezes, um texto pode ser profético. E, mais que qualquer outro governo, a profecia de Dallari se cumpriu no governo Lula, promovendo o acesso ao pão para milhares de brasileiros e muitas outras coisas.

Mas para mim e a minha geração o mais importante da Campanha das Diretas, preparada pelas greves no ABC, foi a percepção de que o povo tudo podia e de que iríamos alterar os destino de nosso país. Como de fato aconteceu.

Ou seja, vivíamos de certa forma, a experiência de estar no vendaval da revolução, mesmo que esta não tenha ocorrido. Por isso, o maior tesouro que carregamos em nossa trajetória foi essa experiência, além da conquista da democracia política. Quem sofreu com a ditadura sanguinária (ela não foi branda como prega certo historiador amigo de José Serra), sabe a importância da democracia.

A ditadura queria uma transição lenta, gradual e segura, para evitar que figuras oposicionistas autênticas e de esquerda em sentido lato tomassem o poder. Nesse sentido, como sublinhou Plínio de Arruda Sampaio, a Campanha das Diretas, as eleições de 1989 e o impeachment de Collor foram momentos em que a porta se abriu para que o povo pudesse passar, mas que a elite conseguiu evitar que a porta se mantivesse aberta com várias artimanhas. Isso só foi possível, em 2002, com a eleição do Lula.

A emenda Dante de Oliveira, que estabelecia as eleições diretas para presidente da República, saiu derrotada. Mas essa campanha criou espaço para que Lula fosse conhecido em todo o país e preparou a vitória eleitoral de anos depois.

O PT e Lula deram grande contribuição nesta luta, sem desmerecer a de outros atores importantes, como Teotônio Vilela, Franco Montoro, Dante de Oliveira, Ulisses Guimarães, Leonel Brizola e outras milhares de pessoas que lutaram por essa causa.

Comemorar os 30 anos do primeiro comício do PT pelas Diretas significa rememorar tudo que aconteceu e entender os desafios que temos para alcançar uma sociedade verdadeiramente democrática. Esta é a esperança que nos move e esperamos que em 2014 possamos dar mais um passo para manter a porta aberta para o povo passar e fazer as transformações necessárias para um país efetivamente democrático.

Por isso, o sentimento de apreço pela democracia e respeito aos direitos humanos deve marcar a ação do PT rumo a 2014, ainda mais no momento em que certo personagem, que deveria garantir a justiça, promove arbitrariedades.

Suas ações se assemelham mais às de um capitão do mato preocupado em agradar aos seus senhores midiáticos no intuito de que o ajudem a ser candidato a presidente da República. O seu requinte de crueldade é tamanho a ponto de substituir o juiz de execução criminal do caso, para inclusive impedir Genoino de dar entrevistas. Ou seja, tirar do cidadão o direito constitucional de se manifestar.

Aliás, nos últimos dias, vendo abuso e arbitrariedade cometido contra o cidadão José Genoino senti a mesma indignação de 30 anos atrás. Senti muito orgulho de nossos companheiros e de nossa militância. Por isso, creio que o PT e os movimentos sociais, que lutaram tanto contra essas atitudes no passado, não devem tolerar isso no momento presente. Do contrário, jogaremos fora a causa pela qual lutamos.

Essa sempre foi a força do PT, um partido que mobilizava as pessoas. Muitas vezes fomos chamados de lunáticos, sonhadores, mas conseguimos com nosso esforço alcançar a democracia. Agora lutamos para aprofundá-la, para que os direitos sejam reais e não citados apenas da letra fria da lei.

Em 2014, duas forças vão se enfrentar novamente. As que querem fechar a porta na cara do povo e as que desejam que a porta continue aberta e se aprofundem as transformações tão esperadas há décadas, especialmente entre outras, a reforma política e a democratização dos meios de comunicação. O meu olhar esperançoso é a certeza de que o meu ato de votar exprimirá silenciosamente a necessidade de avançar e um protesto veemente contra as arbitrariedades de autoridades que abusam do poder e espezinham os direitos dos cidadãos.




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