A Juventude Negra Quer Viver!

A nossa pele, os nossos traços, nossas casas, nosso dia-a-dia, nossa religião, nossa luta, enfim, toda nossa cultura é marginalizada é considerada criminosa, e isso reitera e legitima todo o preconceito que essa sociedade racista propaga sobre nós

Por Juventude Negra
Terça-feira, 19 de novembro de 2013


A juventude negra quer viver pois desde que nossos ancestrais foram trazidos para cá como mercadoria, fomos condenados a exclusão social e cultural. Foi colocado em cada jovem negro, uma espécie de alvo na testa, escrito: Atire aqui! E com toda a institucionalidade deste ato -o de matar-, somos diariamente dizimados do convívio social. Pois não toleram o povo negro desde os primórdios, onde nossos ancestrais foram feitos de escravos para obedecer e cumprir ordens de uma supremacia branca.

A nossa pele, os nossos traços, nossas casas, nosso dia-a-dia, nossa religião, nossa luta, enfim, toda nossa cultura é marginalizada é considerada criminosa, e isso reitera e legitima todo o preconceito que essa sociedade racista propaga sobre nós.

Mais de dois terços de nossa história nesse país, é resumida pela exploração do nosso povo, pelo massacre de negros e negras que foi o período de escravidão nesse país, e atualmente esse massacre continua nas periferias, pelo genocídio da juventude negra, que é friamente assassinada todos os dias, com o aval de nossa sociedade hipócrita e racista. Hoje, a morte de um jovem ou uma jovem negra, passa batido, é naturalizada pois nos colocam como merecedores da morte por causa da nossa cor de pele.

A escravidão no Brasil deixou uma sequela muito grande, pois a visão do negro como mercadoria ainda é difícil de ser derrotada; somos considerados sujeitos de direitos na Constituição, mas quando somos mortos diariamente esses direitos são esquecidos.

Nossa juventude constantemente é violentada, não só com o extermínio provindo das mortes, mas também por não ter uma educação de qualidade, não conhecer suas raízes, e mesmo com a Lei 10.639/03, são privados de aprender a cultura e a história da África nas escolas.

Os meios de comunicação contribuem para que esse racismo social seja perpetuado, pois nos tratam como desumanos em suas várias representações. Poucas são as vezes que vemos os negros na televisão com uma representação positiva e não subjulgada, são raridades. Essa lacuna que não é preenchida com a nossa cultural, causa uma terrível estereotipação do nosso povo negro, onde o impacto é grande nas nossas crianças.

O Mapa da violência - A cor dos homicídios no Brasil de 2010, revelou que de 2001 a 2010, enquanto a morte de jovens brancos no país caia 27,1%, a de negros crescia 35,9%. Com base nos dados do Sistema de Informações de Mortalidade, do Ministério da Saúde, essa pesquisa documentou o que todos nós já sabíamos desde sempre: Que no Brasil, as maiores vítimas de violência são jovens negros, com baixa escolaridade e periféricos. E o racismo é a maior motivação para os crimes. Nós nos confrontamos com números extremamente altos sobre a morte de jovens, que caberiam na realidade de um país onde estivesse tendo uma guerra armada continuada.

Outra pesquisa divulgada recentemente pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), nos apontou que negros são maiores vítimas de agressão policial.

Houve também a Pesquisa Nacional de Vitimização que mostrou em 2009, 6,5% dos negros que sofreram alguma violência tiveram como agressores os policiais ou seguranças privados, contra 3,7% dos brancos.
E isso não é racismo institucionalizado? Esse genocídio não nasceu do abstrato sem base nenhuma. Existem fatos, muitos deles a sociedade não quer enxergar porque carrega em si um racismo incutido em todas suas esferas e não quer abrir mão dos privilégios de uma supremacia branca (mas que dizem ser mestiças para fazer aquela falsa inclusão e dizer que não há racismo) nem do poder que lhes foi concedido em cima de uma minoria excluída.

Nossa perspectiva de vida já está escrita através de estudos: Até 2016, 36.735 (trinta e sete mil, setecentos e trinta e cinco) brasileiros de entre 12 e 18 anos serão assassinados por arma de fogo e a maior parte pela polícia.

Quantos anônimos mais serão os próximos Douglas?

Quem protege o jovem negro se a polícia é que nos mata todo dia?

A frieza com que as autoridades lidam com estes números em pesquisas, é extremamente cruel e violenta. Em uma analogia infantil: é saber que o trem está vindo e não tirar uma pessoa do meio dos trilhos. É algo que supera a crueldade pois uma vez que as autoridades fazem pouco caso das nossas mortes, é como se assinassem embaixo: “Nós aprovamos esta morte”.

Ou somos nós, jovens negros e negras é que estamos exagerando por querer ser tratados com os devidos direitos humanos?

A omissão é o pior aliado quando se trata do genocídio contra a população preta. Este deveria ser um dos principais momentos que os aparatos governamentais não se usassem contra nós para reiteirar nossas mortes.

Fizeram das penitenciarias, réplicas dolorosas das senzalas de nossos avós e bisavós. Mudaram o nome, algumas formas de nos aglomerar, mas este lugar é para onde querem que estejamos presentes. A maioria lá é pobre, preta e periférica.

A PM é filha legítimo da Ditadura Militar que nos acometeu anos atrás. O fato de 70,1% da população não confiar nos diversos trabalhos da polícia, não é atoa. Ou somos nós que exageramos ainda? Em São Paulo, a polícia militar mata mais que a polícia de todo os Estados Unidos da América.

Esse modelo de segurança pública é ineficaz no que se pretende - segurança -.

A polícia de forma geral, continua calcada no seio da proteção somente da elite brasileira, das instituições privadas e garantia de vida das pessoas não-negras com certo poder econômico. Por isso não entramos na caixinha de proteção: Somos pretos, pobres, periféricos. Nosso transporte é coletivo, nossa música é denúncia. Não somos privilegiados.

Douglas queria viver. O Rafael Braga (que foi preso porque estava com garrafa de água sanitária e Pinho Sol, recolhidas das manifestações na rua) quer ficar livre. Tantos outros jovens negros anônimos e anônimas, querem e precisam viver!

A juventude negra quer viver. Os tiros “sem querer” já não nos convencem mais.

É urgente a desmilitarização da polícia em todas suas esferas. Os “Autos de resistência” consistem em disfarçar os homicídios cometidos por policiais civis e militares, e isso precisa acabar. Manter essa polícia impune e ilesa só contribui para o aumento de vítimas pois seus atos são legitimados com uma falsa punição, que só fica bonita estampando machete de jornal. Por isso a necessidade a aprovação do PL 4471/12, que prevê investigação desses crimes cometidos pelos policias em horário de trabalho. Não é o suficiente pois os próprios polícias irão investigar, mas já é algum avanço se caso for aprovada.

Nossa reivindicação é pela vida, é para poder traçarmos nosso futuro. Não queremos fazer parte de estatísticas sangrentas. Queremos viver, pertencer a uma sociedade que não nos mate diariamente.

Por um Brasil sem racismo: A juventude quer viver.





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