"Nosso partido precisa se aproximar dessa geração", afirma Gabriel Medina

Em entrevista ao Portal Linha Direta, o coordenador de Juventude fala sobre as caras e ações voltada ao segmento na cidade, além da visita à família do jovem Douglas Rodrigues, morto no domingo (27)

Por Elineudo Meira - Portal Linha Direta
Sábado, 2 de novembro de 2013



Psicólogo por formação, Gabriel Medina de Toledo foi presidente do Conselho Nacional de Juventude, o Conjuv, órgão ligado à Secretaria Nacional de Juventude da Presidência da República. Segundo Medina, foi uma importante experiência para sua formação e serviu para fortalecer sua militância, além de ajudar na elaboração de políticas públicas.

Desde janeiro, Medina está à frente da Coordenadoria de Juventude, pasta da Secretária de Diretos Humanos da Prefeitura de São Paulo. Um espaço com pouca estrutura, no entanto, importante para efetivar políticas públicas para os cerca de três milhões de jovens da cidade, como conta nesta entrevista ao Portal Linha Direta. Ele fala das novas caras da juventude paulistana, dos dez meses da gestão do prefeito Fernando Haddad, do lançamento do programa Juventude Viva e comenta os desafios e expectativas para os próximos períodos na coordenadoria.

Portal Linha Direta: Pode falar um pouco de sua militância?

Gabriel Medina:
Eu comecei na política como muitos de nós petistas, no movimento estudantil. Desde o movimento secundarista, o movimento universitário e pouco a pouco fui me aproximando de outras atuações na área de juventude. Tive uma relação muito forte com o movimento de cultura, fui produtor de banda, trabalhei com essa parte de shows e eventos na cidade e me aproximei de outras iniciativas como o próprio Fórum Social Mundial e o Acampamento da Juventude. Ajudei a montar uma articulação que chamava Fórum Nacional de Organizações Juvenis e, com todas essas iniciativas, acabei indo para o Conselho Nacional de Juventude, do qual fui presidente em 2011. Foi um momento importante da minha militância, no PT e também nos movimentos Sociais.

LD: Quais são as novas caras da juventude de São Paulo?

GM:
Eu acho que falar de juventude paulistana é falar de diversidade. Não tem uma cara só. Nós temos que olhar a cidade a partir de mudanças que aconteceram nos últimos dez anos. São Paulo não ficou, apesar de não tão estimulado quanto deveria, [ela] passou por um processo de mudanças. Iniciado aí pelo governo Lula e agora continuado pela Dilma. Então, temos uma juventude que tem mais oportunidade, que tem mais escolaridade, mas também que enfrenta desafios mais complexos como, por exemplo, a distância entre a moradia e o trabalho, o que dificulta muitas vezes a continuidade na escolaridade. Eu queria destacar esses três aspectos que acho importantes: esse primeiro da dificuldade do jovem conseguir manter os seus estudos e trabalhar; outra questão é a ausência de equipamentos públicos de convivência, vivência cultural, de lazer e esporte. Esse é um elemento muito central. O shoppings e as igrejas são os espaços mais frequentados pela juventude; e uma terceira dimensão é a dificuldade de encontrar políticas públicas para participação, pro exercício cidadão. Então, o jovem é pouco escutado pela cidade, pouco ouvido, seja na escola ou no seu bairro. Isso certamente precisa ser alterado na cidade.

LD: Qual o seu papel dentro do governo paulistano e junto à sociedade civil?

GM:
A Coordenação de Juventude tem dois objetivos fundamentais: o primeiro estruturar a ideia de construção de programas voltados à juventude, coordenadas por essa área. A gente tem poucas experiências de órgão gestores de juventude que coordenam programas e o programa Juventude Viva está aí pra mostrar que está aí que é possível um órgão de juventude coordenar uma ação política, um plano estratégico pra cidade, com participação de várias secretarias. E um segundo objetivo é construir uma política transversal no governo, é a capacidade de articular, esse tema da juventude nas mais variadas secretarias, ou seja, conseguir ser um órgão de inteligência no governo municipal, que consegue formular dados, diretrizes, elaborar política publica para que na área da educação, cultura, saúde, esporte, possa ter uma visão adequada à realidade juvenil e possa ter políticas públicas que dialoguem com os anseios dos jovens na cidade. E com a sociedade civil a gente só faz esse papel que eu falei, inicialmente a gente escutar muito a sociedade civil, a gente ouve os movimentos jovens, não só aqueles movimentos que a gente já conhece, mas fundamentalmente mergulhar nos bairros da cidade pra escutar grupos de jovens, grupos culturais que às vezes não participam da política, mas que estão fazendo coisas na comunidade, que estão engajadas nos processos de transformação e podem nos ajudar não só com ideias, mas com experiências concretas, pensar as políticas públicas, que podem nós ajudar a pensar numa cidade com mais inclusão da juventude.

LD: Qual o balanço que você faz desses 10 meses de gestão do prefeito Haddad? E do seu desempenho a frente da Coordenadoria da Juventude?

GM:
Primeiro destacar que no governo Haddad nós temos alguns aspectos muito positivos. A recente discussão do plano diretor na cidade, que tem buscado enfrentar a especulação imobiliária, construir outro projeto de cidade, a própria resposta dada pelo prefeito depois das mobilizações de junho e julho em relação a questão da priorização dos transporte público, a política de corredores está muito bem avaliada pela cidade e é um grande ganho para nós a valorização do ônibus, o transporte coletivo, a própria mudança no sistema educacional com o fim da aprovação automática e uma série de iniciativas na educação para melhorar a qualidade da educação. E acho que, fundamentalmente, o Haddad tem conseguido abrir as portas da prefeitura para os recursos do governo federal, porque isso não estava sendo feito nas últimas administrações e nós perdemos uma capacidade de investimento muito alta. Outro elemento que eu queria destacar, além da parceria com governo federal, é a liderança que o Haddad tem tido em temas centrais como as renegociações das dívidas dos municípios, e isso dificulta a capacidade de investimento da cidade, e a própria discussão da CIDE [Contribuições de Intervenção no Domínio Econômico] que vai ajudar a pensar um financiamento para o transporte público a partir da taxação do transporte individual. Então, o Haddad tem apresentado várias plataformas, políticas públicas inovadoras, tem buscado construir, recuperar a capacidade de investimento da cidade e acho que a juventude caminha com isso. Nós não estamos isolados. A gente tem que pensara política de juventude integrada a uma estratégia de governo e é dessa forma que a gente tem se colocado nesses espaços, conseguimos entrar no plano de metas da cidade, a gente tem conseguido fazer essa discussão, de que a juventude tem que ser um setor estratégico para um desenvolvimento de uma cidade mais humana, sustentável e democrática.

LD: Como você vê a relação do governo com a juventude hoje?

GM:
Ela foi tensa. Depois da tomada das ruas, não foi um aspecto fácil. Acho que nenhum vidente conseguiu imaginar essa ebulição nas ruas de São Paulo, no país. Então, não foi fácil, principalmente pra mim, que estava ali, que sempre fui das lutas sociais e agora, desse lado de cá, do governo, ver essas mobilizações, essas manifestações que também acabavam indo muito de frente a nós, no governo. Acho que nós buscamos dar respostas a essas mobilizações. A gente conseguiu fazer uma boa reunião com Haddad há um mês, com mais de 70 organizações juvenis. Chamamos vários coletivos da periferia para conversar, ouvir. O prefeito buscou e a gente fez o Papo Reto, que foi um papo com os jovens pelos bairros da cidade, descentralizamos o diálogo da coordenação com os auxiliares, com os jovens na subprefeituras. E acho que vem melhorando essa relação, acho que é importante que a juventude não perca a sua capacidade de manifestar, de ter uma certa rebeldia. A gente assimila bem isso, acha que isso é importante, mas vejo que é um governo que depende de outro. Aliás, no começo do ano nós fizemos um diálogo com a juventude que teve mais de 200 jovens na galeria Prestes Maia, que iniciou o nosso primeiro processo de diálogo com a juventude na cidade.

LD: Qual a proposta da Coordenadoria em relação às políticas pública para a juventude na periferia paulistana?

GM:
Nossa política pública tem como centro a questão da quebra de barreira da periferia e do centro, dos pobres e ricos. Há muita periferia no centro e há também centro na periferia. Então é muito importante dizer que é a nossa diretriz principal vai em direção a fazer política para os jovens de periferia e pobres. 85% dos jovens, dos três milhões de jovens na cidade, são dessa classe social, então estamos falando de uma política para maioria dos jovens paulistanos. E todas as ações que temos pensado, temos pensado nessa direção, como podemos quebrar essa barreira e como levar recursos que existem no centro para a periferia e como a gente pode garantir mais igualdade de oportunidade pra essa juventude da cidade.

LD: O que é o programa Juventude Viva? Quais são os principais eixos e ações do plano em São Paulo?

GM:
Juventude Viva é um plano lançado pelo governo federal, coordenado pela Secretaria Geral da Presidência, SNJ [Secretaria Nacional de Juventude] e pela Seppir [Secretaria de Políticas de Promoção da Igualdade Racial] de prevenção à violência e promoção de direitos nos territórios mais violentos. É um plano voltado aos direitos da juventude negra e pobre, mais especialmente, negra porque os homicídios no Brasil - que é um pouco foco do plano - abatem a juventude negra três vezes mais do que a juventude pobre branca. E os índices, enquanto diminuem os homicídios na sociedade, aumenta entre os jovens negros. Então, o plano é voltado para a prevenção da violência, para promoção de direitos, para desconstrução da cultura violenta que está aí na sociedade e para o combate ao racismo institucional. São essas as ações que o plano pretende ter como prioritárias. Agora em São Paulo, como em qualquer lugar, tem que ter uma cara própria e que nós buscamos desenvolver, inclusive, pela força que a prefeitura tem. É diferente de um município, como, por exemplo, quando foi lançado o plano em Alagoas. A capacidade de investimento municipal era muito inferior a São Paulo. Então nós demos uma cara própria para o plano e conseguirmos mobilizar a prefeitura com esforços concentrados nesses territórios que nós julgamos mais vulneráveis. São mais de R$140 milhões só de orçamento próprio da prefeitura, para esse plano nos próximos quatro anos. Um compromisso desse governo, inclusive, que contou no lançamento com o prefeito Fernando Haddad, mais de sete secretários...Foi lançado lá no Capão Redondo, onde tinha mais de 500 pessoas, grande participação da sociedade civil. Então, nesse plano está sendo pensado uma cara para São Paulo. Estou muito feliz com esse engajamento, envolvimento do conjunto do governo nessa prioridade política que está, como eu já disse, no plano de metas.

LD: Então há destaque para a questão da vulnerabilidade da juventude negra?

GM:
Claro. A gente trabalha com o enfrentamento contra o racismo. Nós vamos ter uma campanha forte voltada à questão de combate ao racismo. Nós temos falado, inclusive, feito formação dos servidores nessa área na área da saúde, na Guarda Civil Metropolitana. Estamos incluindo o módulo na questão da igualdade racial e na questão geracional em vários cursos de capacitação dos servidores. E o Plano, como é nacionalmente, tem um destaque para essa questão da juventude negra. Pra você ter uma ideia, pelos dados, nós temos um número inferior de jovens negros registrados pelo IBGE. Isso claro, é sub contabilizado, porque depende de auto-definição, mas temos um número superior de jovens negros mortos em São Paulo - chegando a 56% dos homicídios que afetam a juventude negra. Quando a gente olha os dados cometidos pela polícia, o chamado de intervenção legal, esse número dispara para 70% de mortos negros, o que demonstra que temos um grande desafio pela frente, que é conseguir transformar essa cultura racista que estão nas instituições, na questão das instituições, inclusive, de uma violência que é cometida pelo próprio estado.

LD: Quais as expectativas da coordenadoria para o próximo período?

GM:
A nossas expectativas são de ampliar o nosso trabalho e de ganhar mais força no campo intencional e após. Esse primeiro ano, que é um ano difícil para o governo porque você trabalha com o orçamento votado pela gestão anterior, e tivemos só agora o PPA [Plano Plurianual] enviado à Câmara. Depende da aprovação, é um crescimento de 1000% do nosso orçamento. Nós dobramos nosso quadro de servidores da coordenação, temos agora os auxiliares de juventude, estamos tentando, de fato, que cumpram as suas funções. Esse é um processo lento, de formação etc, mas nós não temos mais desvios de função dos auxiliares, como era a marca da última gestão. Estamos preparando a casa para chegar em 2014 com força total. Esse ano, e um ano de arrumação, um ano de preparação das nossas ações de planejamento. Pra você ter uma ideia, nossa equipe da coordenação já cadastrou três projeto no SICONV [Sistema de Convênios] do governo federal, duas estações juventude que foram aprovado, tanto a complementar quanto a móvel, já colocamos mais dois outros projeto pelo Ministério da Saúde com SICONV pela prefeitura, pela coordenação da Juventude, e ajudamos um projeto vinculado ao Ministério da Justiça. Estamos em um esforço enorme de fazer projetos, de escrever políticas públicas, de organizar toda a casa para que em 2014 chegamos com força total na cidade e possamos dar o tamanho que a juventude merece nesse governo.

LD: Como foi divulgado amplamente pela mídia, o Jovem Douglas Rodrigues de 17 anos foi morto por um policial militar no domingo, 27 de outubro. Em sua conta no Twitter, a presidenta disse ter recebido com tristeza a notícia. Você, em conjunto com o secretário de Direitos Humanos da prefeitura de São Paulo, Rogério Sottili, fez uma visita aos familiares do jovem. O que você poderia dizer sobre este fato?

GM:
Foi um caso chocante. Foi o primeiro caso de morte de um jovem pós-lançamento do Juventude Viva. Um jovem de 17 anos que foi assassinado por um PM que, ao que tudo indica, desrespeitou todos os procedimentos legais, não tinha nem abordado o menino. Foi um tiro pela janela do carro, tanto que o PM está preso é réu confesso, inclusive. É um caso que nos assusta. É dramática a situação que vivem os jovens de periferia, principalmente negro. Essa situação, que aconteceu com Douglas, é uma situação ocorre corriqueiramente. E agora, com o Juventude Viva em São Paulo precisamos dar uma resposta efetiva pra esse caso. Visitei a família, eu e o Rogerio Sottili, secretário de Diretos Humanos, e estamos buscando dar todo suporte necessário para que a Defensoria possa apoiar [a causa], que o Ministério Público entre [no caso], para que a gente acompanhe a família, inclusive, para acompanhamento psicológico via prefeitura, via os órgãos da assistência social, ou seja, nós vamos procurar fazer com que esse caso seja exemplar pra que isso nunca se repita mais na cidade de São Paulo. É claro que nós sabemos que vai se repetir e outros casos vão acontecer, mas é caso como este que o Juventude Viva precisa atuar firme, para que a gente possa romper com essa cultura institucional violenta que acomete aos nossos jovens potenciais. A gente não pode ver mais isso acontecer no Brasil e na cidade de São Paulo.

LD: Qual o recado que você deixa para a juventude do PT e a juventude da periferia paulistana?

GM:
Nós estamos em um processo que temos que nos preocupar muito, que é a votação do projeto que termine com os “autos de resistência” na Câmara Federal. Esse é um tema que o PT deve se mobilizar, que a sociedade brasileira, os nossos deputados, nossos ministros. Esse PL [Projeto de Lei] já está para ser votado no plenário da Câmara, 4471/2012. É um projeto muito importante por que São Paulo já acabou com os autos de resistência, mas precisamos fazer que a PM do Brasil toda termine com esse mecanismos que acaba facilitando a morte de jovens de periferia e negros.

E o meu recado para a juventude de periferia, para a juventude do PT, é que junho e julho fizeram muito bem ao Brasil e devem provocar o PT no sentido de ouvir mais as ruas, de se aproximar mais dessa geração. Eu tenho para nem que o PT está muito distante da juventude e acho que esse nosso partido precisa se aproximar (...) dessa geração, das demandas que estão colocadas nas ruas. Queremos uma política menos verticalizada, uma política menos burocratizada, menos feito em gabinetes, que consiga, de fato, um novo jeito de fazer política com ética, com transparência, de forma democrática. Vejo que as ruas serviram bem, inclusive, a Dilma foi a única presidenta a responder o clamor das ruas e isso precisa também repercutir para o nosso partido. Espero que o PT tenha capacidade e ousadia de dialogar com essa geração, para que o partido continue firme e forte nas lutas do povo brasileiro.





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