Senado: Racismo é a motivação para mortes de jovens negros
Todos debatedores alertaram para o fato de o racismo ser a principal motivação das mortes
Quinta-feira, 10 de outubro de 2013
A Comissão de Direitos Humanos (CDH) do Senado discutiu, nesta quinta-feira (10), soluções para o fim da violência cometida contra jovens negros. Para mostrar a urgência do debate, dados da Secretaria de Políticas de Promoção da Igualdade Racial (Seppir) apontam que, de cada quatro assassinatos de jovens ocorridos no Brasil, três são negros.
A maioria dos homicídios que ocorrem no Brasil atingem pessoas jovens. Do total de vítimas em 2010, cerca de 50% tinham entre 15 e 29 anos. Desses, 75% são negros. Em 2009, por exemplo, os homicídios foram a causa de morte de 6.685 jovens brancos e de 18.595 jovens negros, segundo o estudo A Cor dos Homicídios no Brasil. A conclusão revela que o racismo é a principal motivação para o assassinato dos jovens negros.
O dados foram apresentas pelo coordenador da área de estudos da violência da Faculdade Latino-Americana (RJ), Júlio Jacobo Waiselfisz, de 2001 a 2010, enquanto a morte de jovens brancos no País caía 27,1%, a de negros crescia 35,9%. Com base em dados do Sistema de Informações de Mortalidade do Ministério da Saúde, no Brasil as maiores vítimas de violência são jovens negros, com baixa escolaridade. O racismo é a maior motivação para os crimes. Alagoas, Espírito Santo, Paraíba, Pará, Distrito Federal e Pernambuco são as unidades da federação que mais registram casos de homicídios contra negros.
Outro dado da pesquisa mostra que em 2010 quase 35 mil negros foram assassinados no Brasil. “Os números deveriam ser preocupantes para um País que aparenta não ter enfrentamentos étnicos, religiosos, de fronteiras, raciais ou políticos. Representam um volume de mortes violentas bem superior ao de muitas regiões do mundo, que atravessaram conflitos armados internos ou externos” avalia o pesquisador.
A secretária de Políticas de Ações Afirmativas da Secretaria de Políticas de Promoção da Igualdade Racial (Seppir), Ângela Maria de Lima Nascimento, apontou que a pasta apoia a aprovação do Projeto de Lei (PL 4471/2012), que acaba com os autos de resistência. De autoria do deputado Paulo Teixeira (PT-SP), o projeto altera o Código de Processo Penal e prevê a investigação das mortes e lesões corporais cometidas por policiais durante o trabalho. Atualmente estes casos são registrados pela polícia como autos de resistência ou resistência seguida de morte e não são investigados.
Na última semana, o senador Lindbergh Farias (PT-RJ) apresentou a Proposta de Emenda à Constituição (PEC 51/2013), que propõe a desmilitarização das polícias, a criação de carreira única e a instituição de ouvidorias externas desses órgãos.
Para Fernanda Papa, coordenadora-geral de Relações Institucionais da Secretaria Nacional da Juventude da Presidência da República, a criação do Plano Juventude Viva, no ano passado, foi uma primeira resposta do Governo Federal ao problema. Em diferentes programas, a estratégia tem cerca de 40 ações em conjunto com estados e municípios com objetivo de colocar a juventude negra na pauta das políticas públicas.
“Esse plano tem como diagnóstico o fato de os homicídios se concentrarem na população jovem, negra, com baixa escolaridade e residente em bairros pobres. A questão territorial tem sido estratégica do ponto de vista da metodologia do Plano. Mapear os territórios mais problemáticos, a fim de concentrar os esforços do Governo Federal e dos governos locais para esse conjunto de políticas”, explicou Ângela Nascimento.
Representantes de movimentos sociais, presentes à audiência, cobraram uma ação mais forte nas áreas de educação e segurança para frear a violência contra jovens negros. “O racismo é um problema que vai além dos livros. Falta um grande pacto social para que as políticas públicas toquem as pessoas de uma maneira geral. Não adianta só chegar à verba, tem que chegar o verbo para que haja uma transformação”, disse o rapper e escritor Gog.
“Ainda faltam políticas públicas mais eficientes na área da inclusão social que coloquem esses jovens em contato com o esporte, a cultura e a educação. Sabemos que boa parte da juventude negra tem dificuldades em acessar as universidades públicas. Temos o sistema de cotas que está sendo implantado. Esperamos que ele dê um retorno positivo nos próximos anos, mas somente isso não é suficiente. A educação é essencial para todas as pessoas. Mas precisamos construir outras políticas públicas para que os jovens tenham outras possibilidades e não se envolvam com o tráfico de drogas”, relatou a presidenta do colegiado, senadora Ana Rita (PT-ES).
O líder do PT no Senado, Wellington Dias (PI) ressaltou que os resultados desse levantamento permitem que as autoridades do Brasil possam trabalhar diretamente nas causas que originam essas mortes violentas. “Muitas vezes a população é induzida a um pensamento equivocado aqui mesmo no Senado, onde escuto muito o debate: ‘mais polícia, mais arma, mais isso’. A população, de repente, queria ter um policial armado com metralhadora até os dentes na porta de cada um. Às vezes se passa essa ideia que só acaba ampliando a violência”, apontou.
No mesmo sentido, a senadora Lídice da Mata (PSB-BA) defendeu uma profunda reformulação no sistema de segurança pública no Brasil. “A atitude repressiva quanto à política de drogas no Brasil, a atitude repressiva sobre a juventude brasileira, atinge diretamente os jovens negros. Atinge diretamente essa parcela da população, pois ela é a mais pobre e carente. Por isso, acaba sendo a mais vulnerável ao chamamento das drogas”, disse.
Ao final da audiência, os convidados sugeriram a criação de uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) que investigue os casos de extermínio de jovens negros no Brasil.