Ministério da Justiça alerta Câmara sobre inconstitucionalidade da PEC 215
A reunião da CNPI também debateu outras questões indígenas que estão sendo travadas no Mato Grosso do Sul e no Rio Grande do Sul
Sábado, 5 de outubro de 2013
O Ministério da Justiça encaminha nesta sexta-feira (4) à Câmara dos Deputados um parecer jurídico apontando inconstitucionalidade na Proposta de Emenda à Constituição (PEC 215), que transfere do Executivo para o Legislativo as decisões sobre demarcação de terras indígenas.
O documento foi elaborado pela Secretaria de Assuntos Legislativos do Ministério a pedido do ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo. O objetivo é deixar clara a posição do governo e da presidenta Dilma Rousseff sobre a matéria. “Nós entendemos que não é só inconveniente e inoportuna, mas também inconstitucional”, destacou o ministro Cardozo.
Para o deputado Padre Ton (PT-RO), presidente da Frente Parlamentar em Defesa dos Povos Indígenas, o parecer do Ministério da Justiça é importante pois reitera que a PEC é inconstitucional. “E isso é uma vitória para o movimento indígena”. Padre Ton ressaltou as ações da Bancada do PT na Câmara para impedir a tramitação da proposta. “A Bancada do Partido dos Trabalhadores trabalhou unida e se posicionou contrária à retirada de direitos dos índios conquistados na Constituição de 88”, afirmou o parlamentar petista.
Documento - Segundo o parecer jurídico, a PEC sequer poderia ser admitida para deliberação do Congresso, tendo em vista ferir o artigo 60, parágrafo 4º, da Constituição Federal, que proíbe a deliberação de propostas de emenda propícias a abolir a forma federativa de estado, o voto secreto, a separação de poderes e direitos e garantias individuais. “A eventual aprovação da PEC 215 configura violação tanto à separação de poderes quanto aos direitos individuais dos indígenas, que são cláusulas pétreas”, explicou o ministro da Justiça.
“É claro que a Câmara é autônoma para decidir. O governo não dá ordens ao Legislativo, mas espero que os senhores deputados considerem essa posição jurídica, que é tomada pelo governo, com pleno amparo do Supremo Tribunal Federal”, ressaltou Cardozo ao citar o voto recente do ministro Luís Roberto Barroso. O magistrado negou liminar no mandado de segurança contra a tramitação da matéria na Câmara, mas mesmo assim indicou que havia traços de inconstitucionalidade no assunto.
“Barroso disse que, como juiz, não tinha autoridade para fazer cessar sua tramitação se ela ainda não havia sido votada. Não se pode fazer controle de constitucionalidade antes da votação”, explicou o ministro.
Questões indígenas - O anúncio sobre a nota técnica do MJ foi feito quinta-feira (3) durante a 8º Reunião Extraordinária do Conselho Nacional de Política Indigenista (CNPI), que engloba a Fundação Nacional do Índio (Funai), a Secretaria Geral da Presidência da República, o Ministério Público e lideranças indígenas de diversas etnias.
Cardozo informou também que conversou com o ministro Barroso sobre processo que envolve a homologação da Terra Indígena Raposa Serra do Sol, em Roraima, do qual ele é relator.
“Ele me garantiu que na próxima semana libera o voto. Sendo assim, o presidente do STF, Joaquim Barbosa, poderá pautar o julgamento definitivo dos recursos que estão pendentes. Esse julgamento é muito importante porque irá traçar diretrizes não só para processos administrativos, mas também para processos que estão em curso na Justiça. É julgamento muito importante para a questão indígena”, concluiu o ministro.
A reunião da CNPI também debateu outras questões indígenas que estão sendo travadas no Mato Grosso do Sul e no Rio Grande do Sul. O MJ tenta avançar na conciliação, com os governos dos Estados, na disputa de terras entre fazendeiros e indígenas.
Mais de vinte lideranças indígenas participaram do encontro, que reuniu a presidente da Funai, Maria Augusta Boulitreau, e o secretário-Geral da Presidência da República, Gilberto Carvalho.
O cacique Raoni pediu que a interlocução e o diálogo com o governo sejam reforçados para que se possa resolver impasses sem que haja violência. “Precisamos conversar mais para evitar que nossos parentes e o homem branco se machuquem”, pediu o líder indígena.